Era noite. A chuva que
caía não dava trégua e se lançava sobre nossa casa torrencialmente. Como sempre
acontece em noites de tempestade, a energia acabou. Eu, criança ainda, só
poderia estar nervoso e muito assustado; e as estranhas formas tremulantes que
o brilho das velas formava nas paredes simplesmente pioravam tudo, o que me
levava a perguntar a todo instante:
— Pai, quando a luz vai voltar?
— Em breve, meu filho — dizia meu
pai, puxando-me para perto de si. — Logo, logo a chuva vai diminuir, e a luz
vai acabar voltando. Tem que ter paciência.
— Eu queria que a mamãe estivesse
aqui — eu gemi.
— Sim, filho; eu sei. Eu também
gostaria muito. Mas, de alguma forma, ela está aqui conosco. Temos de ser
pacientes.
Meu pai ficara viúvo muito cedo. Eu não
conheci minha mãe, e era ele quem tinha de fazer os dois papéis; ele era muito
cuidadoso comigo. Foi por ver minha aflição é que hoje eu tenho certeza de que
ele fez o que fez.
Deixando-me sozinho por
uns instantes, foi até o quarto e voltou de lá com algo na mão. Reconheci logo
o pequeno objeto: era uma caixa de madeira escura que ele mantinha em sua
escrivaninha. Eu tinha curiosidade em saber o que havia ali dentro, pois ele já
havia me falado que fora vovô quem lhe presenteara com ela ainda em sua mocidade.
— O tempo passa rápido, não é,
filho? — ele perguntou.
— Passa, papai; que nem flecha, né?
— Pois é. Hoje você já está com dez
anos e já é quase um homem, não é?
— Sim, papai.
— Pois, então, é hora de lhe passar
esse presente.
Naquele momento, ele me
entregou a caixa de madeira. Eu já não me aguentava de curiosidade e já ia
abri-la, quando ele me fez jurar que eu jamais a abriria sem o seu
consentimento. Mesmo contrariado, eu sabia que tinha de obedecer. A luz ainda
demorou algum tempo para voltar, mas, de alguma forma, meu medo desapareceu.
Vinte anos se passaram. A
misteriosa caixa se manteve em meu poder. Sempre que eu passava por uma
situação difícil na escola, no trabalho, em minha vida conjugal, eu me
recordava daquela noite de tempestade com papai. A doença de meu filho caçula
foi o pior de todos os momentos. Os médicos só diziam que eu devia ter
paciência que o tratamento demoraria e que mesmo assim o resultado era incerto.
Tive de ter um autocontrole que eu não conhecia em mim. Meu pai acompanhou tudo
de perto. Até que um dia, finalmente, meu filho recebeu alta do tratamento.
Nesse dia meu pai, estando em nossa casa para nos felicitar pela melhora, me
pediu:
— Filho, você ainda tem aquela
caixa?
— Sim, papai.
— Pode apanhá-la, por favor?
Corri até o segundo andar da casa e
voltei como uma flecha para a sala. Ele me disse:
— Agora você já pode abrir.
Nervoso, eu atendi ao seu comando. Fiquei
atordoado por alguns segundos. O silêncio que se formou então só foi quebrado
por uma brejeira gargalhada dele, seguida de um abraço forte e carinhoso.
— Foi a mesma cara que eu fiz quando
seu avô me mandou abrir esse negócio. Esse é o maior tesouro de um homem. E,
hoje, vejo que esse homem está bem na minha frente!
Aquela velha caixa não possuía nenhuma
pedra preciosa, nenhum objeto valioso. Na verdade, ela estava vazia. Mas
através dela percebi que já havia ganhado o meu maior presente: o autocontrole
de saber aguardar pelo momento certo e a paciência do saber esperar.
Fabiano de Oliveira dos Santos Matias
Que história marao💖💖
ResponderExcluirFicaria perfeita narrada em vídeo com os personagens da história, emocionante.
ResponderExcluirAmei.